Giselle Costa – Terapeuta Sistêmica

Não relógio, o tempo passa. O tic-tac não para, e os ponteiros trabalham de forma frenética. (Um dia, a bateria falha, e outra vem em seu lugar, parafraseando Raul Seixas). Em um dia comum, de uma rotina de trabalho, família, lazer e tudo que se repete, ela espreita sorrateiramente com seu olhar analítico, conferindo “o seu relógio fecha com o relógio invisível que todo mundo tem”. Quando tudo foi iniciado? Bem, não sabemos ao certo. Há divergências entre os cientistas: uns dizem que a vida começa na asfixia; outros, quando o coração começa a bater por volta de tantas semanas; outros acreditam que o ajuste do relógio invisível ocorre no nascimento. Vamos dizer que seria no momento do nascimento.

São 4h45 da tarde de um dia no calendário. Nasce um bebê. O relógio invisível é acionado, e o tempo começa a correr. Mas, se pensarmos em uma ampulheta como marcador do tempo, na verdade, é exatamente ali que começamos a morrer. A cada grão de areia que desce, mais próximos estamos da morte. Parece um texto pesado e divertido, mas, acredito, não é. Não somos pessimistas ao olhar para um bebê que acaba de nascer, certo? Ele tem uma vida para viver! E assim o tempo passa, da infância à idade adulta. Muitos eventos acontecem. Certamente, ela, que espreitava a vida, já esteve no cenário de sua história como uma coadjuvante aparente. Sabe aquele acidente que você sofreu? A morte não tinha o papel principal no enredo de sua vida naquele momento, naquela hora e naquele lugar.

Um exemplo nas constelações familiares

Certa vez, ao atender uma jovem de 20 anos, ela, ao representar a dor, trouxe para o campo um arquétipo: o arquétipo da morte. Foi uma das experiências mais fortes que já tive. Ela foi cortada várias vezes na tentativa de suicídio. Ao trazer a informação do campo das constelações familiares para esse jovem, a frase que vinha era impactante: “Eu não trabalho para você. Se tentar novamente, fica em cima de uma cama, vegetando”. Lembrei do trecho bíblico onde se diz que a morte e a vida estão nas mãos de Deus. Diante disso, se o relógio interno marcar a hora da separação entre corpo, alma e espírito, nada se pode fazer, pois isso faz parte de algo muito maior e que, muitas vezes, está além do nosso entendimento humano.

A morte é assim: sem pedir licença, leva quem amamos. Nos separamos de quem nos deu a vida. Não é pergunta se estamos preparados, se queremos ou qualquer coisa parecida. Ela muda a tarde, o dia e a noite de alguém. Sendo jovem ou velho, pobre ou rico, ela desempenha sua função de atriz principal quando chega a hora. Na nossa cultura, não somos ensinados a lidar com a morte, tornando-a uma grande vilã. E acredite: ela não é. No livro As Intermitências da Morte , de José Saramago, é relatado uma cidade onde a morte deixa de cumprir sua função. As pessoas, então, passam a sofrer dores horríveis e não morrem, seja por doenças ou acidentes. Se ajustarmos nossas lentes, veremos que ela é o colapso de um paciente com câncer terminal que agoniza em dores.

Outro exemplo é o conto dos três irmãos de Harry Potter , no qual a capacidade da invisibilidade é devolvida no momento em que o portador já havia vivido tudo que eu precisava. Ele, então, entrega a capa para a morte, de quem se protegeu durante a vida. Não quero convencer ninguém de nada. Apenas desejo que você reflita: ela não é uma vila, mas um condutor de uma embarcação que nos transporta para o outro lado. Você deve estar se perguntando: Que lado? O lado que, te garanto, mostra que a vida é algo muito incrível para ser somente aqui. Em homenagem ao nosso querido Edilei Marcos de Freitas Barbosa, que nos deixou no dia 7 de janeiro de 2025, aos 40 anos de idade.