A violência doméstica e familiar contra a mulher é um problema complexo, que atinge vítimas de toda classe socioeconômica, idade, raça, cor, grau de escolaridade, estado civil e religião. Esse tipo de violência constitui uma das formas de violação dos direitos humanos, além de configurar ameaças aos direitos fundamentais à vida e à propriedade, bem como à qualidade e ao bem-estar social.

Embora a Lei n°. 11.340/2006 seja reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) como a terceira melhor lei do mundo na questão da violência doméstica e familiar, o Brasil é considerado o 5o país mais violento em crimes contra as mulheres, conforme o Mapa de Violência – Homicídios 2015.

IDENTIFIQUE UM RELACIONAMENTO ABUSIVO

A Lei Maria da Penha traz cinco tipos de violência contra a mulher. Um deles é a violência física, que é quando o homem bate ou espanca; empurra, atira objetos, sacode, morde ou puxa os cabelos da mulher; mutila ou tortura; usa qualquer arma branca, como uma faca ou outra ferramenta, além da arma de fogo, para machucá-la.
violência psicológica é quando ele xinga, humilha, ameaça; critica o tempo todo; debocha publicamente; diminui a autoestima; fala que a mulher está louca e tenta controlar tudo o que ela faz.
Também está entre as violações, a violência sexual, que ocorre quando o companheiro (ou ex) força a mulher a ter relações sexuais, ou quando ela está dormindo ou não tem condições para consentir; a obriga a olhar
imagens pornográficas ou a fazer sexo com outra pessoa; não deixa a mulher se prevenir de uma gravidez ou mesmo a obriga a fazer um aborto. A violência patrimonial é quando o homem controla a mulher e seus bens; retém ou tira dinheiro dela; causa danos de propósito a produtos que ela gosta; destrói, detém objetos e documentos pessoais, além de outros bens e direitos.
Por fim, a lei fala da violência moral, que é quando ele faz comentários ofensivos diante de estranhos ou mesmo de conhecidos; humilha publicamente e expõe a vida íntima do casal a outras pessoas, inclusive nas redes sociais; acusa publicamente a mulher de cometer crimes, inventa histórias, fala mal dela para outras pessoas com o objetivo de prejudicá-la e diminuí-la.

Saiba identificar as três principais fases do ciclo e entenda como ele funciona.
Conteúdo: Instituto Maria da Penha
Apesar de a violência doméstica ter várias faces e especificidades, a psicóloga norte-americana Lenore Walker identificou que as agressões cometidas em um contexto conjugal ocorrem dentro de um ciclo que é constantemente
repetido.

FASE 1 – AUMENTO DA TENSÃO

Nesse primeiro momento, o agressor mostra-se tenso e irritado por coisas insignificantes, chegando a ter acessos de raiva. Ele também humilha a vítima, faz ameaças e destrói objetos. A mulher tenta acalmar o agressor, fica aflita e evita qualquer conduta que possa “provocá-lo”. As sensações são muitas: tristeza, angústia, ansiedade, medo e
desilusão são apenas algumas. Em geral, a vítima tende a negar que isso está acontecendo com ela, esconde
os fatos das demais pessoas e, muitas vezes, acha que fez algo de errado para justificar o comportamento violento do agressor ou que “ele teve um dia ruim no trabalho”, por exemplo. Essa tensão pode durar dias ou anos, mas como ela
aumenta cada vez mais, é muito provável que a situação levará à Fase 2.

FASE 2 – ATO DE VIOLÊNCIA

Esta fase corresponde à explosão do agressor, ou seja, a falta de controle chega ao limite e leva ao ato violento. Aqui, toda a tensão acumulada na Fase 1 se materializa em violência verbal, física, psicológica, moral ou patrimonial.
Mesmo tendo consciência de que o agressor está fora de controle e tem um poder destrutivo grande em relação à sua vida, o sentimento da mulher é de paralisia e impossibilidade de reação. Aqui, ela sofre de uma tensão psicológica
severa (insônia, perda de peso, fadiga constante, ansiedade) e sente medo, ódio, solidão, pena de si mesma, vergonha, confusão e dor. Nesse momento, ela também pode tomar decisões as mais comuns são: buscar
ajuda, denunciar, esconder-se na casa de amigos e parentes, pedir a separação e até mesmo suicidar-se. Geralmente, há um distanciamento do agressor. Também conhecida como “lua de mel”, esta fase se caracteriza pelo arrependimento do agressor, que se torna amável para conseguir a reconciliação. A mulher se sente confusa e pressionada a manter o seu relacionamento diante da sociedade, sobretudo quando o casal tem filhos. Em outras palavras: ela abre mão de seus direitos e recursos, enquanto ele diz que “vai mudar”. Há um período relativamente calmo, em que a mulher se sente feliz por constatar os esforços e as mudanças de atitude, lembrando também os momentos bons que tiveram juntos. Como há a demonstração de remorso, ela se sente responsável por ele, o que estreita a relação de dependência entre vítima e agressor.  Um misto de medo, confusão, culpa e ilusão fazem parte dos sentimentos da mulher. Por fim, a tensão volta e, com ela, as agressões da Fase 1.

É PRECISO QUEBRAR ESSE CICLO. E A LEI MARIA DA PENHA ESTÁ AO LADO DAS MULHERES PARA ISSO.

As mulheres que sofrem violência não falam sobre o problema por um misto de sentimentos: vergonha, medo, constrangimento. Os agressores, por sua vez, não raro, constroem uma autoimagem de parceiros perfeitos e bons pais, dificultando a revelação da violência pela mulher. Por isso, é inaceitável a ideia de que a mulher permanece na relação violenta por gostar de apanhar.

NÃO SE CALE

Quando a vítima silencia diante da violência, o agressor não se sente responsabilizado pelos seus atos – isso sem contar o fato de que a sociedade, em suas diversas práticas, reforça a cultura patriarcal e machista, o que dificulta a
percepção da mulher de que está vivenciando o ciclo da violência.

SAIA DO CICLO

Com o tempo, os intervalos entre uma fase e outra ficam menores, e as agressões passam a acontecer sem obedecer à ordem das fases. Em alguns casos, o ciclo da violência termina com o feminicídio, que é o assassinato da vítima.

O REGISTRO DA OCORRÊNCIA

O primeiro registro de ocorrência relacionado com violência contra a mulher pode ser feito:

  • Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher
  • Em qualquer Delegacia de Polícia Civil de Minas Gerais
  • Pela Delegacia Virtual
    https://delegaciavirtual.sids.mg.gov.br

Obs.: É possível registrar ocorrências de lesão corporal, vias de fato, ameaça e
descumprimento de medida protetiva.
Em qualquer unidade da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG).

  • Existe também a opção de denúncia pelo Disque 180. Os fatos narrados nesse contato serão encaminhados à Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG), que irá apurar a denúncia e tomar as providências necessárias. Não é um registro de ocorrência, mas é uma alternativa caso o denunciante seja um vizinho, amigo ou parente de uma vítima que talvez não possa ir até uma delegacia ou se sinta ameaçada para denunciar.
  •  URGÊNCIA – Também é possível acionar a Polícia Militar pelo número 190 em casos urgentes.
    No momento de uma violência, a PMMG poderá socorrer essa vítima e, inclusive, efetuar a prisão em flagrante do agressor.
  • App MG Mulher – O aplicativo é uma importante ferramenta para a segurança da mulher, pois permite a criação de uma rede de apoio com compartilhamento de localização da vítima para que pessoas de confiança e cadastradas pela própria mulher possam acionar a polícia. No aplicativo, disponível gratuitamente para download tanto para o sistema operacional Android quanto para o iOS, a mulher também encontrará os
    endereços e telefones das instituições mais próximas da sua localização que podem auxiliá-la em caso de emergência, como delegacias da Polícia Civil, unidades da Polícia Militar e Centros de Prevenção à Criminalidade. Além disso, ainda estão disponíveis no app conteúdos multimídia repletos de informações relativas à temática da violência doméstica. São vídeos, textos e áudios que poderão ajudá-la no enfrentamento do problema, ampliando o seu conhecimento e fortalecendo as suas tomadas de decisões.

ATENDIMENTO:

Na delegacia, a mulher em situação de violência poderá:
– Solicitar medidas protetivas de urgência.
– Solicitar acompanhamento até o endereço informado para que ela possa retirar seus pertences em segurança (roupas, documentos e medicamentos).
– Receber a guia de exame de corpo de delito.
– Solicitar encaminhamento para casas abrigo.
– Realizar a representação criminal para a devida responsabilização do agressor.
– Ser encaminhada para serviços de atendimento psicossocial.
– Ser incluída em programa de prevenção da Policia Militar.
– Receber encaminhamento para orientação jurídica na Defensoria Pública.
Solicitação de medidas protetivas de urgência:
As medidas protetivas de urgência são direitos previstos na Lei Maria da Penha que buscam a proteção da mulher em situação de violência no ambiente familiar, afetivo e doméstico.
Por se tratar de medida de urgência, a mulher pode fazer a solicitação na delegacia ou no Ministério Público, e o
pedido é encaminhado ao juiz. A lei diz que a autoridade judicial deverá decidir o pedido no prazo de 48 horas.
É possível ainda fazer essa solicitação pela Delegacia Virtual – (https://delegaciavirtual.sids.mg.gov.br/).

Tipos de medidas protetivas:
– Proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus
familiares e das testemunhas, fixando o limite
mínimo de distância entre esses e o agressor;) contato com a ofendida, seus familiares
e testemunhas por qualquer meio de comunicação.
c) frequência a determinados lugares a fim de preservar a integridade física e
psicológica da ofendida.

– Suspensão da posse ou restrição do porte de armas.
– Afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida.
– Restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar.
– Prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

Desde 2018, o descumprimento de medida protetiva de urgência é crime e pode levar o agressor à prisão em flagrante. Sem direito, inclusive, a fiança por parte da autoridade policial.
Portanto, sempre que o agressor descumprir uma medida protetiva, avise à polícia. No exato momento do descumprimento, em flagrante, ligue 190 e acione a Polícia Militar. Se o fato já aconteceu e não houve tempo ou condições para o acionamento da PMMG, registre a ocorrência o quanto antes.
Esse registro pode ser feito pela Delegacia Virtual, na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher ou em qualquer unidade da Polícia Militar.

ACOMPANHAMENTO O ATÉ ENDEREÇO INDICADO PARA RETIRADA DE PERTENCES EM SEGURANÇA
Muitas vezes, após uma violência, a mulher sai de sua casa apenas com a roupa do corpo e teme retornar e ser novamente violentada. Para garantir a segurança dessa vítima, a Polícia Civil poderá acompanhá-la até sua casa, ou outro endereço informado, para que ela possa buscar seus pertences em segurança (roupas, documentos e medicamentos).
A GUIA DE EXAME DE CORPO DE DELITO
Após o registro de uma violência doméstica, em alguns casos, é imprescindível que seja realizado o exame de corpo de delito. O exame será uma prova importante para garantir a responsabilização do agressor. Por isso, quando a
Polícia Civil expedir a guia de exame de corpo de delito, a mulher deve realizá-lo o mais rápido possível.
ENCAMINHAMENTO PARA CASA ABRIGO
As casas abrigo são locais que acolhem a mulher em situação de violência e seus filhos, quando não possuem outro lugar para ficar, ou não se sentem seguros em seus lares, e precisam desse suporte até que possam ser tomadas as devidas providências em relação ao agressor e à segurança da vítima. Verifique se em seu município há casa abrigo.

REPRESENTAÇÃO CRIMINAL
Em alguns casos, dependendo do tipo de crime cometido pelo agressor, a Polícia Civil só poderá iniciar a investigação criminal se a mulher fizer a representação contra ele. É possível solicitar medida protetiva sem que a representação criminal seja feita, logo não haverá investigação nem responsabilização do agressor.
No entanto, em outros casos, independentemente da vontade da mulher, a Polícia Civil vai iniciar a investigação e a responsabilização do agressor. Após o registro da ocorrência, mesmo que a vítima não queira e se declare desinteressada na ação, a PCMG terá que agir. São os casos de crimes de ação penal pública incondicionada. Tendo a informação do delito, a Polícia Civil deverá tomar as providências. Isso acontece, por exemplo, em situações de estupro, de lesão corporal e de tentativa de feminicídio. Obs.: quando for fazer um registro com representação criminal, caso tenha provas da violência para apresentar à Polícia Civil, lembre-se de disponibilizá-las de forma que possam constar no inquérito policial. Por exemplo, se são ameaças em mensagens de texto, leve-as impressas; se forem por áudios, grave-os em CD, DVD ou pen drive. Isso pode agilizar o atendimento e evitar que seu aparelho celular tenha que ficar na delegacia.

PROGRAMA DE PREVENÇÃO DA PMMG
A Polícia Militar executa o Serviço de Prevenção à Violência Doméstica que tem como objetivos propiciar um atendimento mais humanizado à mulher vítima de violência doméstica e familiar; garantir o seu encaminhamento aos demais órgãos da Rede de Atendimento, de tal forma que receba do poder público, no menor tempo possível, a atenção devida ao seu caso; e, atuar na dissuasão do agressor, incidindo na quebra do ciclo da violência.

ORIENTAÇÃO E ACOMPANHAMENTO JURÍDICO DEFENSORIA PÚBLICA
Atua nos processos de medidas protetivas de urgência: pedidos de medidas protetivas, complementação de medidas protetivas, descumprimento com agravamento de medidas protetivas, impugnações às contestações, recursos
etc. Atua ainda na área de família: petições iniciais de ações de divórcios, reconhecimento e dissolução de união estável, guarda, regulamentação de visitas, alimentos e partilha de bens. Verifique se em seu município há atendimento da Defensoria Pública.

MINISTÉRIO PÚBLICO
A Promotoria de Justiça atua em todos os processos relacionados à Lei Maria da Penha: requerimentos de medidas protetivas; inquéritos policiais e ações penais relativas aos crimes. Há atendimento às mulheres em situação de violência doméstica com o objetivo de prestar orientações, obter informações, ouvir necessidades e colher provas
sobre os referidos processos. Verifique se em seu município há atendimento do Ministério Público.
PODER JUDICIÁRIO
O Poder Judiciário é o responsável por deferir ou indeferir os pedidos de medidas protetivas. É ele que vai julgar todos os feitos da Lei Maria da Penha, além de ações e processos decorrentes da prática de violência. Além da realização das audiências judiciais, há atendimento ao público nos balcões das secretarias dos Juizados, não sendo necessária a presença de advogado ou defensor para tanto. Quando determinado, também haverá atendimento pela equipe multidisciplinar.

FIQUE SABENDO!
Relacionamentos homoafetivos: a violência doméstica contra a mulher independe da orientação sexual. Logo, uma mulher pode ser a agressora e, portanto, responsabilizada conforme a Lei Maria da Penha.

Fonte: Manual de Enfrentamento da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher – PCMG